Histórias de Brooklin

Brooklin...
Uma noite qualquer (ou ontem, se assim quiserem) …
A banda sonora dá o ambiente de bairro, ao som de 50 Cent e a sua G-Unit, numa sonoridade que se mistura no éter com o cheiro a escape da cidade.
No fundo do cenário, na óbvia câmara lenta, três personagens caminham alinhadas em direcção ao centro da acção.
As luzes da cidade jogam com as sombras que os escondem mas no bairro todos sabem que não são destes lados… são sulistas, são gente do Bronx (também conhecido como Gaia).
Noutro dia qualquer, noutra circunstância qualquer, seria um princípio de noite sangrento, assente na rivalidade e na defesa de territórios mas não hoje, porque estes homens estão sob a protecção de P. “Mad Dog” Silva (Mad Dog é a tradução inglesa de Manecas).
Dirigem-se para as suas rides discutindo temas triviais, lances do jogo, o caminho de regresso. Nada os podia preparar para o que estava a chegar…
Ao arrancar, Freddy L. bate num carro mal parado… até aqui tudo normal, pois o estatuto de gang member convidado é garante de imunidade…
Mas dentro da podre carrinha saem dois peruanos… e isso muda tudo…
Das duas, três: ou são foragidos assassinos a soldo a mando de algum cartel de droga sul-americano; ou são imigrantes ilegais sem documentos e sem nada a perder; ou são dois irmãos que trabalham numa empresa familiar de canalizações e reparações eléctricas (para além de produzirem e venderem flautas de pã e tocarem música dos andes à porta do Via Catarina).
Das três possibilidades, a pior: canalizadores e electricistas tocadores de flauta de pã… e pra piorar, legais, com seguro do carro em ordem e tudo…
A mossa na carrinha não foi grande e quase não se notava (até porque a carrinha tinha a frente feita em esterco), mas de facto havia uma amolgadela por cima da roda dianteira direita.
De imediato, todos saem dos carros e sacam o que mais temiam, as declarações amigáveis… o ambiente era cada vez mais tenso e, pra piorar, tocava Leonard Cohen num dos rádios dos carros… e toda a gente sabe que quando a banda sonora muda num filme, algo de importante está para acontecer…
A acção desenvolve-se em três frentes: enquanto Freddy L. preenchia a declaração amigável (enganou-se, teve de pedir outra, a nova não duplicava as informações, enfim, acção que dava pra escrever outro filme), os peruanos descarregavam a carrinha cheia de ferramentas eléctricas do Mestre Maco e aparelhagens para os seus espectáculos e chegavam os homens de Brooklin, para averiguar o que se passava no seu território (ou então para irem embora, já que os carros tavam todos parados no mesmo sítio).
Tudo se resolve tal é a influência dos membros do gang de Brooklin até que o enredo dá nova reviravolta… entre em cena a personagem que ninguém quer ver… sim, a “Senhora do Carro Azul”…
Qual Hannibal Lecter, qual Skeletor, era mesmo ela… no seu carro azul, qual quadriga dos infernos, ela entra em cena com a subtileza de um lutador de sumo saltitando…
Abre a janela e põe a cabeça de fora… tensão no ar… ouve-se a sua fina voz:
- Então e o triângulo? E os coletes?
P. Mad Dog Silva tenta acalmar os ânimos:
- Tenha calma minha senhora… - e sussurrou – parece um agente da autoridade…
Má escolha de palavras…
Sai do carro de rompante, e aproxima-se de Mad Dog num pulo. Enche o peito de ar e do alto do seu metro e cinquenta e quatro exclama a bom som:
- Mas tu conheces-me de algum lado para me chamares senhora, Cara%&#? Fod#%$&, se tivesse aqui o meu genro já não falavas assim para mim!
João “Nem estacionado está bem” Magalhães tenta acalmar a fera mas acaba por piorar a situação.
- Fod#%$& - gritava ela – olha que eu conheço a tua mãe! E a tua também! – exclamava apontando para os dois jovens…
Por sorte ou desígnios do destino, a “Senhora do carro azul” decide partir…
Ao entrar no carro, fitando os gang members que a olham atónitos depois de avisados de que podiam ser castigados pelas suas mães (hoje não há sobremesa para ninguém), a perigosa mulher disse a frase da noite:
- Se vocês não pedem desculpa peço eu, que sou uma senhora…
Se foram os comprimidos que acabaram ou se era ela que já estava bem bebida (já tinha jantado como disse sabiamente D. Conijo) não sabemos. Mas as suas palavras ecoarão para sempre nas mentes daqueles que as ouviram…

2 comentários:

Girondin disse...

eu não estive là [já tinha ido embora] mas com um relato desses até consigo imaginar a acção toda. Principalmente o P. "Mad Dog" Silva...

Anónimo disse...

E assim passou mais 1a horita no bairro Brooklin onde tudo se passa e nada acontece...
P.S.:adorei o relato dos factos...